Uso no transporte acelera expansão de cartões contactless para outras áreas, diz diretora da Visa

O uso de cartões bancários contactless (sem contato) e de smartphones para pagar o transporte público ajudará a expandir o uso dessa tecnologia para as lojas, restaurantes e outros negócios, prevê a Visa.

“Temos notado como a implantação de cartões contactless no transporte publico empurrando toda a indústria financeira a reemitir cartões, de modo que eles possam ser usados não só no transporte, mas também em todos os outros lugares”, diz Ana Reiley, diretora de produtos da Visa que integra a equipe de Mobilidade Urbana Global, baseada em Londres. Ela conversou com o blog durante uma visita a São Paulo. 

A empresa tem estimulado a adoção de cartões bancários nos transportes, e ajudou a implantar essa tecnologia em 35 cidades pelo mundo. Reiley estima que 200 cidades já contam com essa tecnologia em suas redes. 

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O uso de cartões contactless ainda é baixo no Brasil. Isso é um problema para seu uso no transporte?

Não. Ao contrário, é justamente uma oportunidade. Foi exatamente a mesma história em Nova York e nos Estados Unidos. Em geral, nas Américas, as pessoas não estão habituadas a esta tecnologia ainda. Mas temos notado como a implantação de cartões sem contato no transporte público está empurrando toda a indústria financeira a reemitir cartões, de modo que eles possam ser usados não só no transporte, mas também em todos os outros lugares. 

Há planos de levar esta tecnologia a outras cidades do Brasil?

Nós estamos trabalhando nisso. Há algumas cidades além de São Paulo e Rio de Janeiro, que conheceram a tecnologia e querem ser parte desse movimento.  É algo comum pelo mundo: uma cidade grande por perto adere, mostra que é possível e outras vão atrás. E estamos em contato com várias autoridades de transporte, da Argentina ao México, para ajudar parceiros tecnológicos e operadores de transporte a habilitar o uso de cartões contactless.

Ana Reiley, diretora de produtos da Visa (Divulgação)

Qual a velocidade do avanço pelo mundo?

Em Londres, a tecnologia foi lançada cinco atrás. Foi preciso cerca de três anos para atingir 1 bilhão de transações com cartões bancários no transporte. No entanto, levou só um ano mais para chegar a 2 bilhões. E mais três meses para chegar a 3 bilhões. 

Em Nova York, em três meses, foram registrados cartões de 80 países diferentes do mundo. E as pessoas viajam, veem isso em outras cidades, e querem usar onde moram também. 

Quanto tempo costuma durar a implantação desta tecnologia?

Depende. Cada solução é diferente. Se a operação tem uma estrutura complexa de tarifas, que variam de acordo com a hora, o número de viagens etc, e que envolvem diferentes operadores, empresas públicas e privadas, é mais complexo. Mas há outras que gerenciam só ônibus e possuem só uma tarifa. Neste caso, a implantação é muito mais fácil.

Como exemplo, começamos a trabalhar com a MTA, de Nova York cerca de 14 anos atrás, e a tecnologia só está sendo lançada neste ano. Mas lançamos em Roma e tudo foi feito em seis meses, porque eles replicaram o que já havia sido feito em Milão. 

O que atrasa as coisas?

Os governos têm uma grande influência nesse processo. Eles chegam com grandes ideias, mas mudam de ideia o tempo todo. E são trocados a cada quatro anos. E os operadores de transporte, que são o coração de qualquer projeto, precisam estar alinhados com o governo. Geralmente, estão. 

Nosso trabalho é identificar quais parceiros tecnológicos podem ajudar a habilitar o uso de contactless, e também orientar nossos parceiros financeiros sobre os requisitos que o processo de pagamento demanda. E, assim, aconselhar os operadores de trânsito sobre quais tecnologias estão disponíveis e tornar as coisas mais fáceis para eles. 

Como levar mudanças para negócios onde há contratos firmados para décadas?

Temos visto essa questão em várias cidades, como Milão. Mas mesmo que já exista um contrato com um parceiro tecnológico, isso não significa que esse parceiro tenha que ser usado para implantar a tecnologia contactless, porque é um sistema diferente. 

Neste sistema, é possível ter descontos, como pagar várias viagens com uma só tarifa?

Sim. Embora o teste atual em São Paulo não inclua isso, o backoffice oferecido está pronto para aceitar descontos temporais e integrações entre modos diferentes. Se você pergunta como integrar o sistema de cartões de transporte com o de cartões bancários, tecnicamente tudo é possível.

O pagamento com celular é mais comum do que com cartões de crédito?

Sim, temos visto isso no Rio de Janeiro, em Nova York e em muitas cidades cosmopolitas. Trabalhamos de mãos dadas com Apple, Google e Samsung para aprimorar o uso. A Apple fez uma atualização recente que faz com que você não precise comprovar sua identidade para pagar o transporte público, o que deixa mais fácil. É também algo muito cultural. Há casos de pessoas que dizem que preferem usar o celular aos cartões de crédito porque se sentem mais seguras assim. 

Há  planos de usar reconhecimento facial e QR codes?

Em uma visão pessoal, sou a favor de dar opções aos usuários. Quanto mais opções dermos para as pessoas, maior o risco de conquistá-las. Mas ao mesmo tempo, fica maior o custo para implantar e manter a estrutura. Se o sistema tem cartões bancários, QR codes, cartões de transporte, reconhecimento facial e bilhetes de papel, é mais complicado para implantar e muito mais caro para se manter. Sou 100% a favor de dar mais opções e de testar novas coisas, inclusive reconhecimento facial, mas os operadores precisam considerar os custos, o tempo e o esforço operacional que está por trás de implantar diferentes soluções.

Creio que o reconhecimento facial será uma grande coisa no futuro, mas do ponto de vista técnico, ainda não chegamos lá, porque é preciso consenso sobre como as pessoas vão se sentir sobre isso. Há questões como a de San Francisco, que baniu o uso de reconhecimento facial para qualquer uso pelo governo ou por organizações. 

A Visa tem planos de atuar em outras áreas do transporte?

Sim. Nos vemos como um parceiro para todo o espaço urbano, não só para o transporte público ou compartilhado, mas também para o transporte privado. Estamos falando sobre estacionamentos, pedágios, micromobilidade, como patinetes elétricos. Estamos trabalhando em pilotos em várias cidades ao redor do mundo. 

Nosso propósito é a integração de todos esses diferentes sistemas, com ênfase na praticidade. Os usuários querem usar o transporte, sem pensar sobre comprar bilhetes. É nosso trabalho, como indústria, tornar isso mais fácil e mais justo. E garantir que ao fim do dia eles possam fazer as contas facilmente e ter acesso a uma tarifa justa. 

Esses planos vão na direção do modelo Maas (Mobilidade como Serviço)?

Precisamente. Você oferece um só backoffice que integra todas as transações feitas em um dia. Ele calcula as tarifas, e te cobra em apenas uma transação. E no caso de você não ter como pagar ao fim do dia, ele te coloca em uma lista de restrição, de modo que as empresas de transporte podem gerenciar os riscos do modelo de pós-pagamento.